No post que escrevi recentemente sobre segurança aérea, falei superficialmente da nossa dificuldade em termos noção dos números muito grandes e dos muito pequenos. Essa dificuldade matemática tem implicações na forma como olhamos para a ciência. Quando lidamos com intervalos de tempo ou com distâncias espaciais muito grandes (isto também se aplica às distâncias muito pequenas do mundo atómico, mas neste post não falarei disso), temos dificuldade em perceber o significado da ordem de grandeza de que estamos a falar, por estarmos demasiado habituados à nossa vida na Terra: uma vida humana dura tipicamente menos de um século e o nosso planeta tem um raio de pouco mais de 6 mil km. Em comparação, falar em milénios ou anos-luz não significa nada para a nossa intuição - sabemos que é muito, mas não temos uma verdadeira percepção de quanto é.
Para dar um exemplo das implicações que esta nossa dificuldade pode ter, no seu famoso livro Cosmos, Carl Sagan defende que a resistência de muitas pessoas à evolução de Darwin está, em parte, relacionada com o facto de não conseguirmos ter uma noção real da lentidão da evolução das espécies ao longo das eras geológicas. E depois comenta assim, desta forma tão acertada quanto bela: "O que significam 70 milhões de anos para criaturas que vivem um milionésimo desse tempo? Nós somos quais borboletas, esvoaçam um dia e pensam que é para sempre".
Como ultrapassar, então, essa dificuldade? Uma forma útil é pensarmos em proporções, isto é, de que maneira se relacionam esses números com os números que nos são mais familiares. Richard Dawkins tem uma proposta interessante no seu livro Unweaving the Rainbow. Imaginemos livros de 500 páginas em que cada página é dedicada a um ano, e comecemos a empilhar livros. Distâncias temporais como 2000 anos, que nos parece muito tempo, não se situam muito acima do chão nesta nossa hipotética pilha: "Se queremos ler, por exemplo, sobre Jesus, temos de escolher o volume que está 20cm acima do chão, ou logo acima do tornozelo". Quanto à descoberta do fogo, seria necessário "subir a um nível um pouco superior à Estátua da Liberdade". Para ler sobre "os australopitecos (...) teria de subir a um ponto mais alto do que qualquer edifício de Chicago". A origem da vida estaria relatada num livro que teriamos que colocar a aproximadamente 500km de altura.
No fabuloso video que se encontra abaixo, tenta-se dar uma noção do tamanho dos planetas do Sistema Solar comparando-os em proporção. Depois, comparam-se com o Sol e com outras estrelas da Via Láctea (recomendo que se faça duplo clique sobre o video para ser visto em tamanho maior e em HD no YouTube). O problema é que, a partir de certo momento, mesmo estas analogias deixam de fazer sentido, e a própria proporção já não nos dá uma verdadeira noção das distâncias temporais ou espaciais. Como comparar o tamanho da Terra ao da última estrela do video, a hiper-gigante vermelha VY Canis Majoris? E, mesmo assim, esta comparação não é nada se pensarmos nas aterradoras distâncias do espaço vazio que separam as estrelas.
No comments:
Post a Comment