Friday, January 1, 2010

'Copenada', por Miguel Monjardino

Destaque habitual para o artigo de Miguel Monjardino, publicado na edição do Expresso de 24 de Dezembro.

A culpa não é certamente da Europa", gritou o primeiro-ministro irlandês, Brian Cowen, às duas da manhã de sábado passado, depois da última reunião com os seus exaustos colegas europeus na capital dinamarquesa.

Copenhaga prometeu ser uma cimeira muito importante do ponto de vista político para a União Europeia. Para Bruxelas, o que estava em jogo era a liderança internacional numa questão que tende a ser vista como vital para o futuro da humanidade. No coração desta liderança não estavam exércitos nem armamento sofisticado mas sim regras legais vinculativas e a criação de um mercado internacional para as emissões de dióxido de carbono. Se há coisa que Bruxelas sabe fazer é criar as regras legais essenciais para o funcionamento de qualquer mercado.

A cimeira começou num ambiente optimista mas na madrugada de sábado passado, Copenhaga era uma mistura de resignação, desilusão e fúria. A negociação de última hora de Barack Obama com Wen Jiabao, primeiro-ministro da China, e os Presidentes da Índia, Manmohan Singh, do Brasil, Lula da Silva, e da África do Sul, Jacob Zuma, resultou num acordo particularmente cruel para os líderes europeus. Quando o sol nasceu no sábado tornou-se evidente que a ambição de a União Europeia liderar através do exemplo na redução das emissões de dióxido de carbono tinha falhado. Como uma desgraça nunca vem só, em vez da prometida liderança, Bruxelas e as principais cidades europeias tiveram muito pouca influência no resultado final. Em vez de capital da prometida esperança, a capital da Dinamarca transformou-se numa 'Copenada' política.

Que explica este falhanço? Afinal de contas, George W. Bush está de volta ao Texas, qualquer líder político que se preze já prometeu reduzir drasticamente as emissões de dióxido de carbono dos seus países nas próximas décadas e a maioria das opiniões públicas parece aceitar que o aquecimento global é mesmo um problema de destruição maciça.

Duas razões explicam o que aconteceu. A primeira está relacionada com a tensão entre o crescimento económico e os custos da redução das emissões de dióxido de carbono. A principal ambição de qualquer sociedade e governo na América Latina, África ou Ásia é desenvolver rapidamente a sua economia. Esta ambição é perfeitamente natural. E também é natural que estas sociedades e governos vejam no carvão e no petróleo - duas fontes de energia baratas mas altamente poluentes em termos de emissões de dióxido de carbono - instrumentos essenciais para conseguir a curto prazo melhores níveis de vida. A redução das emissões é possível mas, sejamos claros, tem um custo elevado. Para os países mais pobres este custo é incomportável. O que nos leva à segunda razão para o caos de Copenhaga - como é que os enormes custos financeiros da adaptação a um mundo com menos emissões de dióxido de carbono devem ser repartidos entre os mais ricos e os mais pobres? Como se tornou penosamente claro na capital dinamarquesa, não houve acordo em relação a este ponto essencial.

Onde ficamos? Dezassete anos depois, a tentativa de gerir politicamente o problema do aquecimento global através das reduções de emissão de dióxido de carbono é um desastre. Apesar de todas as promessas e retórica política, as emissões aumentaram imenso. Pior é impossível. A evolução geopolítica tornará ainda mais difícil conseguir um consenso político global nesta questão.

Se Bruxelas quiser liderar internacionalmente nas áreas da energia e do ambiente terá de abandonar o projecto quixotesco de um acordo global vinculativo ao nível da redução carbono e passar a ser um exemplo ao nível da inovação tecnológica. Infelizmente, suspeito de que não será este o caminho escolhido.

O choque iraniano
O funeral do grande ayatollah Hossein Ali Montazeri na cidade de Qom, na segunda-feira, mostrou que o Irão será um dos grandes temas da política internacional em 2010. De um lado está um grupo revolucionário determinado a usar a questão nuclear como guarda-chuva nacionalista para camuflar o seu assalto ao poder. Do outro estão estudantes universitários e cada vez mais clérigos e iranianos conservadores indignados com os assassínios, tortura e violações nas prisões do país.

17
anos depois da cimeira do Rio de Janeiro de muitas promessas, as emissões de dióxido de carbono nunca foram tão elevadas como agora. Copenhaga foi um desastre político para a União Europeia. Precisamos de mais inovação e de menos retórica e teatro.

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O processo de aproximação da Sérvia, Montenegro e Macedónia à União Europeia continua

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A oposição dos sindicatos dos professores e dos democratas a um programa de cheque-educação que permite a crianças pobres em Washington, DC, ter acesso a escolas privadas

Miguel Monjardino

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