Faz 12 anos desde que estreou o último filme de James Cameron, altura em que o mega-sucesso Titanic foi lançado. O realizador de Terminator 2, um dos melhores filmes de acção da década de 90, fez com que fosse criada uma grande expecativa em torno de Avatar: há mais de uma década que o filme estava a ser preparado, e só não foi lançado antes porque James Cameron estava à espera que existisse tecnologia suficientemente avançada para corresponder às suas ambições.
Hoje, a tecnologia existe: o 3D e o digital são, de facto, impressionantes. No entanto, o grande talento de Cameron já não se vislumbra desde 1991, ano em que estreou o 2º filme da saga Terminator. A primeira parte de Avatar retrata o contacto do personagem principal com o povo que habita o planeta Pandora, que mantém uma íntima relação com a Natureza. Infelizmente, essa relação é básica e foleira: espiritualismo recheado de diálogos new age vazios de conteúdo; bicharada mística de todas as cores e feitios a passear pelo ecrã só para fazer bonito, sem possuir qualquer funcionalidade dramática; personagens completamente quadradas e simplistas, sem um pingo de complexidade.
De certa forma, esta abordagem é quase a antítese do que Terrence Malick fez em The New World quando John Smith, acabado de chegar a América, estabelece contacto com os indígenas. Nesse filme, a personagem de Colin Farrell descreve, sob o lindíssimo 2º andamento do concerto nº23 para piano de Mozart, um mundo sem invejas, sem violência, sem traição, sem mentiras, sem ódios; apenas a mais pura beleza, gentileza e paz. No entanto, através do poder das imagens de Malick, que embora extraordinariamente belas não estão lá só para isso, vamos percebendo que aquele povo também evidencia, embora de maneira diferente, os vícios que a personagem principal não conseguia ver, garantindo-lhes uma complexidade fascinante. Contudo, em Avatar a beleza é apenas visual, sendo que a profundidade cinematográfica fica ausente. Aquele povo não é composto por verdadeiras personagens, mas apenas por bonecos simbólicos cujo único objectivo é fazer passar a mensagem de Cameron.
Na segunda parte, os humanos resolvem destruir esse mundo pacífico, espiritual e amigo da Natureza. Aqui, o que salta à vista, não obstante a conhecida capacidade do realizador para filmar acção de qualidade, é uma mensagem ambientalista forçada a martelo pelos olhos do espectador adentro, mais uma vez sem o mínimo de subtileza e de complexidade.
Posto isto, queria agora abordar as questões tecnológicas relacionadas com o cinema. Avatar tem sido visto por muitos como o filme que vai revolucionar o cinema, e que acabou de ditar o cinema do futuro. Não é verdade. A tecnologia do 3D tem vindo a ser aperfeiçoada ao longo dos últimos anos, e de facto atinge aqui um estádio elevado de qualidade, sendo que o 3D de Avatar é de um realismo impressionante.
No entanto, é preciso garantir que o cinema não fica em função do 3D, pois é o contrário que deve acontecer. O que temos visto ultimamente é que esta tecnologia não costuma ser utilizada para dar profundidade à imagem e para contribuir para a atmosfera do filme, mas apenas para fazer umas brincadeiras com objectos que parece que vão contra o espectador, e situações parecidas. Cameron conseguiu resistir a esta tentação, mas acabou por falhar na mesma: se as próprias imagens não têm profundidade cinematográfica, o 3D não fará milagres.
E é isto que os realizadores, se quiserem aproveitar as potencialidades das novas tecnologias, têm que ter em mente. Um filme que precisa do 3D para funcionar bem, não passará de uma espécie de viagem de montanha-russa ou de qualquer carrossel de feira-popular. É muito divertido durante os minutos em que se está lá dentro; depois, passou à história. Contudo, isto não é Cinema.
O verdadeiro Cinema fica para a História.
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